os momentos despendidos aqui são de reconciliação com a vida

terça-feira, 31 de dezembro de 2013

algo acaba - algo começa

meça o que começa
nao como quem acaba

mas como quem arremessa
um porvir que nao é nada.

considere o que nao interessa
ideia clara, nova, velha, borrada

vai assim sem pressa
faz do tempo tua morada

que de repente numa travessa
escura
perdida
incerta
pode ter uma charada

que vai te divertir à beça.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

poesia para o saraumberê

o ar às (avessas)

inversos - reversões - imaginações - desejos - estares - diversares - diversões

corpos 
simples corpos 

respirando

com ajuda de 
palavras necessárias
sons necessários
movimentos necessários
cores necessárias

corpos
simples corpos

inventando 

universos respirando o ar às (avessas)
numa espécie de
sarau.

domingo, 13 de outubro de 2013

Para os cadernos de impressões da Isa Ferraz

parece isca
amarra, percorre, traça,
fura também
linha que se aventura e descobre
diz futuridades inexistentes
como se materializasse a possibilidade de um porvir
incerto como o local do furo
o grão o grão
grande sugestão
caminho desfeito despercorrido por ninguém
um vão entre o tempo da correria
linha que se aventura e desvia
do que já não quer, talvez já não consiga, inglutir.
se amarra:
na ideia.
faz carreteis de deslumbramentos
linhas digitais redondas como dedos se reconfigurando
dedos que já não querem mais dedos ser
sejamos os dados,
dedos errados, de preferência.

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

libertango

tanto dilúvio
insistências

tanto dentro

tanto fora

cala a flor que murcha
nada reclama
contudo
tem uma força sem tamanho

vísceras de tango
olho para este teclado
cada letra me remete a uma palavra
cada palavra abre a porta para um poema

grande
teria

juras
tolas
dores
turvas
vindas
asas
pernas
coxas
mãos
unhas
desejos

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Céu da boca

ESTRELAS
Imagem primeira de um céu 
Ideia que nasce
E na metrópole morre.
Na maior cidade
Menos estrelas,
Na menor cidade
Mais luzes
luscos fuscos
Obtusos olhares
Estrangeiros
Estrangeiro
Sou todo olhar percepção. Imaginação
No movimento dos teus céus
Sua língua
Junto à minha
Sua boca
Perdida
No caminho torto
Da minha boca.
Assim te vejo
Céu
Estrela
Beijo
Boca

quinta-feira, 28 de março de 2013

Poemeto Contemporâneo

Memórias que sangram.

Singram os defeitos internalizados

ladeiras de superações se impõem

e desafios de personalidades rastejam por entre a noite

de lua cheia.

Singelas

as lembranças minam de profundezas

olhares miram o tênue véu que cobre o lago

da memória.

Moram no despejo inusitado

lodos de certezas fundas, caminhos  desvariados,

cada qual arremessa seu pedregulho e forma ondas

pequenos desvãos nos cursos previsíveis

sendas inusitadas germinam de palavras que moldam o mundo

golas de camisas comuns que vestimos,

dia-a-dia,

detalhes que engolem o que nasce e cola no esôfago,

goles de poemas que brindam a asia, o desuso, a infinita

sede desse impetuoso fim de calar as calhas que colhem os restos;

dados ao léu

disfunções que distam de sedes

eus silenciosos.

Seus.

Zeus.

Deus(zes).

Sau.

Dades.

Ades.

(^)

sexta-feira, 15 de março de 2013

cada sentimento se mistura

uma imagem traz a tona

à margem

toa aquilo que cobre

descobre aquilo que destoa

e que outrora

guardava convicto

de que o silêncio

fazia dormir as palavras

intui o erro

caminho verdejante sobra sozinho

e a grama queima

sobra do mato pouco

os animais fogem

galinhas

cobras

macacos

micos ficam

pulando de galho em galho

de gole em gole

de fala em fala

sem vergonha

como uma criança que fala um absurdo

sem saber que é um absurdo.

domingo, 17 de fevereiro de 2013

fragmentos

redesafinando sóis
longilíneas linhas
incompatíveis desejos
sois nadas
caminhos 
devires 
conjecturas
calientes
sombrias serenatas ao meio dia
sem sóis
som sem


pãosdeló





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outrora o tempo me avisou
sim, eu sou sem forma
amorfo
sem vez
se assim é
o ser
para ser





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O delírio e a desgraça de se conhecer alguém é que a partir de poucas palavras escutadas se engendram no pensamento inúmeras sentenças que são além de imaginação, que constroem a realidade e se divertem com o pouco conhecimento de mundo de nós.




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Já dizia o sábio chinês:

de noite cachaça
de dia linhaça






"SONO TABS"



desperto
dispersa pensamentos
dispara inquietudes
maneja a argila de sonhos
da matéria bruta
sua beleza escuta
e amassa
com suas próprias mãos 
a realidade
seus afetos
suas indisciplinas
clama sua responsabilidade
sobre o imprevisível
falha
de sua boca brotam tristezas úmidas
quase engasga com tudo que perde
seus poros se abrem
agora é todo ventosas
tentáculos que alicerçam
que absorvem
que chupam
que se banham
em chamas
em angústias
quer dar forma às coisas
sem deixar que se apodreçam
os usos
canta desvarios
e eles pulam pelo mundo
como um bando de macacos recém-nascidos
sempre em bando
os desvarios
desacata suas próprias leis
e sofre
por destruir suas próprias obras
caminha por florestas úmidas
colhe das árvores absurdos
e se banha com o óleo viscoso
que regurgita com seus arrependimentos
inventa admirações e desprezos
deseja sentimentos
planta todos restos
todo o lixo para dentro de casa
todos os nojos pra o corpo
guarda inutilidades
tem carinho por absurdos
caberia o mundo em seu armário
se o mundo se deixasse caber
no seu armário
ou se não existisse armário
nunca seleciona as sementes
todas estão no armário
é só abrir a gaveta e de lá transbordam
oceanos de lama
no qual se banha
se lama
sê lama
se ama
pinta seus alvos dentes com a lama fria
e sente prazer nisso
e sente desprazer nisso
destoa
acaricia a longa barba
de sua mulher
e descobre
ama ser desprezado
enfia seu focinho no travesseiro
germina lágrimas como num mudário
cada muda de mudez
espera
tem espera
tem esperança
torna visível o que não diz
constrói
tece com longas agulhas dolorosas
seus pensamentos
e eles tomam forma
mói a teia e passa
na cafeteira
acredita que seu sonho despertara
e faz
cafés cafés cafés cafés
cafés cafés cafés cafés
cafés cafés cafés cafés
cafés cafés cafés cafés
cafés cafés cafés cafés
cafés cafés cafés cafés
até que o café deixe de ser café
e se torne qualquer coisa
nova
faz o mesmo com cafunés e outros
detalhes
guarda todo seu passado num potinho
-o menor possível deles-
e solta em alto mar
esvazia uma cápsula e nela insere
tudo o que não inventou
toma antes de dormir.

Sono Tabs.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

caminhava sobre o lodo
ruminava sobre o todo
que seu estômago englutia

tinha imensidões sobre o papel
e tentava inutilmente
desmentir suas desverdades
nos limites imperdoáveis do branco

tropeça, quase cai,
de boca toca a lama, toma cores,
deságua e leva vela derretida
multifacetada
o chão lhe pergunta:

que te carrega?

ao que responde:

a solidão é a espinha dorsal da abstração humana.

e o chão:

ossos, cartilagens, medulas, nervos, isso não são abstrações, isso são tal o tao.

e o homem:

tens razão, mas qual o uso de tudo isso? com isso se dança, sómente se dança, nada mais, e dança é abstração.

e o chão:

dança não é abstração.

e o corpo:

corpo é abstração.

e o poema:

calma lá, você não pode sair assim sem mais nem menos assustando todo mundo que cruza teu caminho.

e a poesia:

pode.

sábado, 19 de janeiro de 2013

pequeno texto sobre criação


dizem que toda arte é produzida com 1% de inspiração e 99% de transpiração.
pois bem.
sempre tive minhas tretas com isso. talvez por achar que inspiração é muito maior do que esse 1%. talvez por pensar que esse papo é de quem não tem realmente inspiração.
hoje a coisa é diferente.
vejo que  inspiração é de fato algo passageiro. mas não dá pra medir a proporção, nem comparar com a tal da transpiração. não acredito que nenhum desses elementos sejam mensuráveis, e também não gosto da ideia que essa proporção, de 1 pra 99, pode acabar passando – de que a inspiração é uma coisa boba, e que o que importa mesmo é a labuta do artista para ser bom.  
inspiração é algo que ocorre, toma conta, sacode, arrepia e vai embora. vai embora mesmo. volta outro dia, de outro jeito, sobre outra coisa, com outras cores. falando outra língua. é quando algo de dentro da gente de repente se junta com algo que acontece do lado de fora, e esse encontro produz uma sensação diferente do habitual.
talvez a transpiração seja o conseguir dar conta desse momento sem tempo em que algo de dentro se sacode, em que os olhos enxergam diferente. dar conta, prestar muita atenção, e deixar ele passar, para trabalhar então com a memória, com a sensação que ele deixou.
talvez essa seja a transpiração, porque realmente não é fácil. emburacar na memória, buscando um rastro do relâmpago que passou, do vento que sacudiu as folhas da árvore, diferente do vento que as sacode agora. e cutucar a memória, recheada de afetos, não é algo simples. pelo menos não para mim. os caminhos vão se abrindo, e não dá pra controlar muito pra onde o coração vai.
a transpiração acontece pelo esforço de saber separar as coisas. porque às vezes certas portas se abrem, e algumas lembranças saem, trazendo seus cheiros, seus sons, seus medos e suas coragens. e a canseira que dá é a de decidir se essa ou aquela porta é melhor para o momento, para o que se quer criar.
hoje entendo criação como isso: mergulhar em si, buscar combustível na memória que case com a inspiração que bateu. e disso fazer algo novo, que valha a pena ser dito, ser expresso. que seja verdadeiro, honesto – resultado desse mergulho, dessa entrega para mais de uma coisa ao mesmo tempo: você mesmo, a memória, a inspiração, o ponto de interrogação que sabe que algo novo pode ser feito, ou algo velho, mas de um novo jeito.
é dessa relação e desse comprometimento, que pode ser mais ou menos excludente e intenso, é dessa aventura que se dá a transpiração. esse é o trampo, a treta do artista.
de fato, é preciso coragem. muita, muita coragem.