os momentos despendidos aqui são de reconciliação com a vida

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

segundo poema mineiro - a manhã há de nascer

traga meu peito
- e ele é fraco -
as lástimas que derramam quando
caminho sem saber por onde
os que trago comigo despudoradamente
peitos que me acompanham
-e sem eles nada sou-
e me fazem alegrias só
alegrias

toda a tristeza vem de saber
que eu não sou capaz de
sempre, sem nenhuma exceção,
fazê-los, como a água faz a planta sedenta,
sempre mais
e interessados com as presenças e o mundo
que, atordoador, não perdoa nem uma lágrima

quanto mais a infelicidade que a ele distribuo.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Quando o sol de manhãzinha ou tardezinha lança uma luz muito mais do que conveniente em qualquer situação, penso que

gosto de acreditar num
deus-diretor de belos filmes.

domingo, 24 de outubro de 2010

primeiro poema mineiro

hoje eu descobri
que nunca
a esperança
é a última que morre:

estas são sempre
as falsas-esperanças.

sábado, 23 de outubro de 2010

osmose


na ânsia de amar o corpo adoece
porque qualquer possibilidade
de aceitar a imperfeição
desconhece

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

defeito é o nome
que algum deus estreito
deu para um ser
que cambaio
na verdade
foi perfeito

vulgo

eu

ou

tu

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

tomei a liberdade de excluir alguns comentários do blog, me desculpem.

Vida verdadeira - Thiago de Mello

Pois aqui está a minha vida.
Pronta para ser usada.
Vida que não guarda
nem se esquiva, assustada.
Vida sempre a serviço
da vida.
Para servir ao que vale
a pena e o preço do amor

Ainda que o gesto me doa,

não encolho a mão: avanço
levando um ramo de sol.
Mesmo enrolada de pó,
dentro da noite mais fria,
a vida que vai comigo
é fogo:
está sempre acesa.

Vem da terra dos barrancos
o jeito doce e violento
da minha vida: esse gosto
da água negra transparente.

A vida vai no meu peito,
mas é quem vai me levando:
tição ardente velando,
girassol na escuridão.

Carrego um grito que cresce
Cada vez mais na garganta,
cravando seu travo triste
na verdade do meu canto.

Canto molhado e barrento
de menino do Amazonas
que viu a vida crescer
nos centro da terra firme.
Que sabe a vinda da chuva
pelo estremecer dos verdes
e sabe ler os recados
que chegam na asa do vento.
Mas sabe também o tempo
da febre e o gosto da fome.

Nas águas da minha infância
perdi o medo entre os rebojos.
Por isso avanço cantando

Estou no centro do rio
estou no meio da praça.
Piso firme no meu chão
sei que estou no meu lugar,
como a panela no fogo
e a estrela na escuridão.

O que passou não conta ?, indagarão
as bocas desprovidas.
Não deixa de valer nunca.
que passou ensina
com sua garra e seu mel.

Por isso é que agora vou assim
no meu caminho. Publicamente andando
Não, não tenho caminho novo.
O que tenho de novo
é o jeito de caminhar.
Aprendi
(o que o caminho me ensinou)
a caminhar cantando
como convém
a mim
e aos vão comigo.
Pois já não vou mais sozinho.

Aqui tenho a minha vida:
feita à imagem do menino
que continua varando
os campos gerais
e que reparte o seu canto
como o seu avô
repartia o cacau
e fazia da colheita
uma ilha do bom socorro.

Feita à imagem do menino
mas a semelhança do homem:
com tudo que ele tem de primavera
de valente esperança e rebeldia.

Vida, casa encantada,
onde eu moro e mora em mim,
te quero assim verdadeira
cheirando a manga e jasmim.
Que me sejas deslumbrada
como ternura de moça
rolando sobre o capim.

Vida, toalha limpa
vida posta na mesa,
vida brasa vigilante
vida pedra e espuma
alçapão de amapolas,
sol dentro do mar,
estrume e rosa do amor:
a vida.

Há que merecê-la

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Caralho

estou bêbado

e queria escrever um poema.

Porém meu cansaço me faz dizer somente

que na verdade


queria dormir com a Pema.

Animal Pema e poema rimarem,

assim como a pena e o problema.

ou o amor e a dor,

para usar uma retórica mais catedrática.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Depoimento do poeta meditante

Concordo.
Mas apesar de consentir,
não calo.

Ausência de certezas,
Ausência de portos-seguros,
sim.
Nada de novo no front.

Agora,
na ausência de palavras noite adentro,
de deslumbramento,
na ausência de virtude,
e de vinho,
meu amigo...
És presunçoso
por achar que estás
sozinho.

Quanto à ausência de Sidarta e de Pema,
te digo:
levo-os sempre comigo.
Ainda que doente,
meu peito os leva contente
e em segredo,
sem nenhum traço de medo
ou sigilo
[com relação à eles meu peito está tranquilo.

Porém, quando leio
que falta lida com a escuridão da vida,
meu peito se estremece:
tome cuidado com a palavra
que tece,
pois és sabido o bastante
pra saber que não é verdade.

Meu silêncio
nunca foi tanto
este embate no escuro
quanto agora.
E por isso,
pra humanidade eu digo:
Xóra.

Nunca quis ser reflexo de nada
além de mim mesmo,
[quiçá dos que vão comigo.
Por isso caminho na caverna
de meu umbigo
para ver se acho um novo corpo,
ou novos corpos,
e jogo velhas peles fora.
Velhas bagagens,
velhas poeiras,
que meus cantos ainda sem poesia
calharam de acumular.

Me reservo no direito de
meditar.

Me frustro também,
não se assuste.
Mas até que algo
em mim finalmente
se desajuste,
silencio.

Acredite, quando digo
que podes confiar em teu amigo.
Traço, pois,
um diário
de viagem
[te mostrarei quando voltar.

Até lá,
segura a onda,
não perca o pé.
Que quando for a hora boa,
pegaremos um jacaré.

sábado, 9 de outubro de 2010

A serpente é a metáfora da revelação.

Vejo um véu vívido e vacilante
servindo vis desejos
no passado impensados.

Vísceras vazam como cheiros
e voam entre aqueles
que têm olfato atento.

A mulher é a metáfora da revelação.
Troca de pele
como o poeta escreve
um poema para a lua;

mas precisa de um carinho nu
cheio de dedos
calados e calejados
para recordar
que na mais aparente grosseria das couraças descartadas
esconde-se a profundidade mais íntima.

Quando tudo parece pouco
curva-se o mundo a um olhar
que nos faz parecer caber
dentro de nosso corpo.
Tudo que se sente
se mente

cada ato da vida é regido
pelo corpo

satisfações
são
insatisfações

e os segundos;
minutos horas dias
em vias de.

porém
sinto algo que clama
e quero partir ao encontro
de uma dama
de espadas
de copas
de paus
ou de ouros

o que importa
é que seja

dama

dona

de minhas incertezas.

Coisas do mundo, minha nêga.